Natal

Não dá pra respirar dentro da taça de absinto. O vapor sufoca e evapora meu ar. Leva pro céu, junto com a minha sanidade, todas as minhas lágrimas que já saem dos meus olhos secas. O verde eufórico que eu vejo no fundo do copo contrasta mortamente com o azul que invade meu corpo a cada gole morno que desce pela minha garganta. Quando o gole queima até a ponta do dedão do meu pé, eu sinto um formigamento subindo como que uma fada que me faz cosquinha por dentro, roçando as asas de leve, dos meus pés dormentes até a minha cabeça - com uma pausa quente no meio das pernas.

Olho pro sofá e vejo meu amor, embriagado pela dor e o tédio, dormindo, alheio às respostas das minhas mãos a cada estímulo da minha mente. Vejo ali, um corpo que me chama, apesar de inerte, apesar da primeira dose apenas, apesar da dor e do cansaço, apesar do tédio que adormece.

É tão bom pensar em um Natal que não será solitário - penso eu, em meio a tantos pensamentos por segundo. Tão bom compartilhar luzinhas e bolas na árvore, e pitangas colhidas no pé. E compartilhar o pisar descalço na grama e o sonho de papai noel, mesmo sem papai, sem mamãe, sem irmã e sem noel. Mas com você. Com ele. Comigo.

Tão bom pensar que o sexo natalino pode ser feito todos os dias do ano, juntos com uma promessa de que o ano vindouro será ainda melhor. Mais verde, mais morno, mais dormente, mais gostoso, mais compartilhado, mais.. opa! O corpo inerte se levanta. Frio. Ah, sim. Fechar a janela...

Talvez se ele vir onde minhas mãos percorrem esses pensamentos... E onde esse álcool evapora minhas asas de fada para longe... Eu vou até ele, fazê-lo me alcançar antes que meus vôos absintos me levem tão longe que eu escape de seu alcance...

E sigo com um feliz natal nos peitos e um próspero ano novo mais abaixo. Hohoho.